Os Honorários e a Defesa na Justiça do Trabalho
45 A Justiça do Trabalho, nascida como órgão integrante do Poder Judiciário por força do art. 94, da Constituição de 1946, foi criada com o objetivo de oferecer uma prestação jurisdicional célere, justa e especializada na solução de um dos conflitos mais antigos e injustos do mundo, o conflito capital/trabalho. Ela se diferenciou por compreender que o Direito do Trabalho deveria funcionar como anteparo de proteção à exploração do homem pelo próprio homem. Mais ainda, quando entendeu que para atingir a sua missão constitucional seria preciso apostar e aprofundar os seus princípios fundamentais, ainda mais em razão do Brasil por se caracterizar como um país claramente desigual.
O novo órgão jurisdicional, no entanto, manteve alguns procedimentos do período em que exercia função meramente administrativa e sem qualquer competência judicial. Dentre estes institutos típicos da atividade administrativa se destaca ius postulandi, que permite ao interessado propor ação perante o Estado sem a constituição de advogado. É escrever em outras palavras, a inexistência de honorários advocatícios por sucumbência na Justiça do Trabalho sempre esteve umbelicalmente ligada à questão “dispensabilidade” dos advogados em processos administrativos. Nestes, como se sabe, sempre se entendeu que os postulantes podem optar por constituir advogado, o que o excluiria a outra parte do ônus em pagar honorários pelo exercício de um direito elencando no rol das faculdades.
O avançar do tempo fez ampliar o papel da Justiça do Trabalho, fortalecendo a sua capacidade técnica e o seu papel social. Esta evolução se faz notar na crescente preocupação com o fortalecimento do direito de defesa e com a valorização da própria Justiça do Trabalho. Embora em movimentos tímidos, as mudanças são percebidas através da jurisprudência e da legislação posterior à CLT. A título de exemplificação, pode-se apontar o reconhecimento da incidência de honorários advocatícios quando o patrono do obreiro é designado pelo sindicato da categoria profissional, nos termos do caput do artigo 14 e § 1º da Lei nº 5.584/70. Outro avanço se fez com a dicção do artigo 133 da Constituição Federal, especialmente quando pontificou ser “o advogado indispensável à administração da justiça”, o que, de logo, deveria ser entendido como de imediata revogação da autorização do questionado ius postulandi das partes. Na mesma linha evolutiva está a Emenda Constitucional 45/2004, especialmente quando da ampliação da competência da Justiça do Trabalho, e que motivara, em razão dela, o deslocamento de inúmeros processos que antes estavam sob a alçada da justiça comum. Nestes casos, o TST avançou e reconheceu de imediato a incidência dos honorários advocatícios sucumbenciais, nos termos do art. 20 do CPC, que antes só eram formuladas perante a Justiça Comum. Esta orientação consta da Instrução Normativa 27, art. 5º, que expressamente estabeleceu que as “lides decorrentes da relação de emprego, os honorários advocatícios são devidos pela mera sucumbência.”
Uma batalha, ainda não vencida, vem sendo travada pelos advogados que atuam no Direito Coletivo do Trabalho, mais especificamente aqueles que são vinculados às entidades sindicais. Não obstante a Lei nº 5.584/70 assegurar os honorários advocatícios, sem a menor lógica jurídica, se consolidou o entendimento, como o cristalizado na Súmula 26, do TRT da 3ª Região, de que não seriam eles devidos nos casos em que os sindicatos atuassem por substituição processual. A citada súmula desprezou a importância e complexidade da substituição processual, como instituto que conferiu maior dinamismo e efetividade ao processo do trabalho. Pondere-se que, segundo tal entendimento, seria mais proveitoso para o profissional propor as ações individualmente, reclamando honorários em cada uma delas, assoberbando os foros laboristas, o constitui inegável assistemia e má política judicial.
Felizmente o cenário que impedia a aplicação dos honorários advocatícios começa a ser modificado. Após intensos debates e lutas judiciais, com a participação da OAB, ABRAT, AMAT e várias entidades, a jurisprudência evoluiu para reconhecer o direito aos honorários nas rescisórias e principalmente nas apontadas ações coletivas, com substituição processual pelos sindicatos. A recente Súmula 219, editada pelo TST, bem reflete estes novos tempos: “HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. HIPÓTESE DE CABIMENTO (nova redação do item II e inserido o item III à redação) – Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011II – É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista. III – São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como substituto processual e nas lides que não derivem da relação de emprego.
É de se destacar, neste novo contexto, a decisão do TRT da 3ª Região quando, acatando pedido da OAB/MG, cancelou a famigerada Súmula 26, e agora seguindo a norma do TST. Cabe ao advogado trabalhista, em suas Ações Coletivas, o dever da reivindicação dos honorários sucumbenciais recentemente conquistados. Espera-se, agora, que o Judiciário Trabalhista continue avançando quanto ao tema, expandindo a incidência dos honorários pelo trabalho dos advogados nas instâncias recursais excepcionais (revista, agravos, embargos para a SDI, dentre outros), mormente quando pacificada a questão da impossibilidade do ius postulandi na instância trabalhista superior. Cabe ao advogado trabalhista, em suas Ações Coletivas, o dever da reivindicação dos honorários recentemente conquistados.
Mas, certamente, a questão será melhor resolvida através da modificação legislativa. E dela tem cuidado a OAB. Neste sentido é de se destacar o Projeto de Lei nº 3392/2004, que institui a indispensabilidade do advogado e a concessão ampla de honorários na Justiça do Trabalho. Ressalta-se que esta PL foi aprovada em primeiro turno em novembro/11, na CCJC (Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania) da Câmara Federal, composta por sessenta deputados, dentre eles o advogado mineiro Dr. Grilo, não coincidentemente membro da Comissão de Direito Sindical da OAB/MG. Agora, esta PL seguirá no Senado e, em seguida submetida à sanção presidencial, em almejado êxito.
Em conclusão, ao manter facultativa a presença do profissional encarregado da defesa das partes que dela busca o amparo, a Justiça do Trabalho necessita se despir da toga da contradição entre a sua missão e o resultado obtido. Em razão disso, não mais se pode conceber facultativa a presença do profissional encarregado da defesa das partes que dela busca o amparo, pois tornar opcional a presença do advogado na Justiça do Trabalho, com a complexidade adquirida com o passar dos anos, é o mesmo que dizer que o direito postulado nasce com o vício da imperfeição jurídica e social. E quando se afirma que o ônus pela imprescindível contratação de um advogado deve ser imposto ao lesionado, sem medo de errar, a Justiça do Trabalho permanecerá não compreendendo integralmente a sua missão. Afinal, retirar a defesa técnica promovida por um advogado é impedir que o lesionado respire do oxigênio que o faz vivo na luta por seus direitos.
Bruno Reis de Figueiredo
Advogado, sócio dos escritórios Cezar Britto Advogados Associados e Reis Figueiredo Advogados Associados
Cézar Britto
Advogado, sócio dos escritórios Cezar Britto Advogados Associados e Reis Figueiredo Advogados Associados